Criança que planejou ataque em Anápolis estava traumatizada e se identificava com atiradores de Suzano

Classificado como um "bom aluno" na Escola Municipal Dona Alexandrina, menor tinha bom relacionamento com os colegas e desvios de comportamento já haviam sido comunicados à família

Denilson Boaventura Denilson Boaventura -

Eram pouco mais de 07h20 da manhã desta segunda-feira (02) e as aulas na Escola Municipal Dona Alexandrina, instalada no bairro homônimo da região Norte de Anápolis, estavam prestes a começar. Há oito anos como vigia, Carlos Alberto, de 66 anos, conhece muito bem não só o funcionamento da instituição, como a maioria dos alunos. E esse olhar atento evitou uma tragédia.

Sem uniforme e tentando se esconder pelos cantos dos corredores para não ser visto, um estudante de onze anos conseguiu entrar na sala de aula do 6º ano portando dois facões. Mas notando que havia algo de errado com o comportamento do garoto, o senhor Carlos, como é conhecido, resolveu ir atrás dele para saber o que estava acontecendo.

“Eu cheguei e vi a turma toda com medo. Devagar, falei pros meninos saírem correndo e aí ele [o estudante] acertou uma menina com o lado contrário do facão. Nisso, eu comecei a dizer ‘você sabe que eu gosto de você e todo mundo aqui gosta de você, larga isso aí’. Depois, eu bati minha bengala na mesa, ele assustou e largou um facão, então eu mandei ele soltar o outro. Daí eu peguei ele e falei que a gente ia conversar lá fora”, narrou o servidor.

“Ele deve ter armado tudo na cabeça, mas esqueceu que nunca tinha feito isso e na prática não dava conta”, analisou senhor Carlos em coletiva de imprensa, durante à tarde na Escola Municipal Dona Alexandrina, que contou com o prefeito Roberto Naves (PTB) e o secretário municipal de Educação Alex Martins.

Nenhum aluno se feriu com o ocorrido e autoridades e órgãos como Polícia Militar (PM), Polícia Civil (PC), Conselho Tutelar e Juizado da Infância e Juventude, que foram acionadas, estão acompanhando o caso. O núcleo de psicologia da Secretaria Municipal de Educação (Semed) está na unidade para acompanhar a situação, orientando os envolvidos e reforçando ações de combate à violência no ambiente escolar.

Vigia Carlos Alberto, prefeito Roberto Naves e secretário Alex Martins em coletiva de imprensa. (Foto: Rafaella Soares)

‘Amigo de todo mundo’

Patrícia Pereira, de 39 anos, diretora da Escola Municipal Dona Alexandrina, explicou que o garoto não era um mau aluno e tinha um bom relacionamento com os colegas. Apesar disso, professores da instituição já haviam notado alguns desvios no comportamento apresentado por ele e orientando à família a tomar medidas com relação a isso.

“Ele sempre estudou aqui e sempre foi um aluno muito bom, mas viajou com os pais para Portugal ano passado e foi maltratado lá. Ficou traumatizado. Os pais desistiram de tudo lá e vieram embora por isso, para cuidar dele. Mas aqui ele começou a ter crises de ansiedades e a gente falou para os pais procurarem ajuda psiquiátrica”, explicou.

A educadora elencou ainda que o estudante de um tempo para cá passou a se isolar, mas mesmo em seu próprio canto era amigo de todo mundo. “Os meninos relataram que ele costumava a desenhar e era bom desenhista só que de desenhos de arma e de cabeças ensaguentadas. Alguns [colegas] disseram que sabiam, mas que não contaram por medo”.

Desde a tragédia em Suzano (SP), em que um massacre deixou dez estudantes mortos, o aluno da Escola Municipal Dona Alexandrina consumiu uma grande quantidade de reportagens sobre o caso e, conforme a diretora da instituição, passou a se identificar com os atiradores. “No caderno dele tinha o nome dos garotos de Suzano, é algo que ele deveria estar planejando há dias”, pontuou.

Vigilância nas escolas

Além prestar apoio à comunidade escolar, o prefeito Roberto Naves informou que a Prefeitura de Anápolis vai agilizar o processo para que os vigias atuem nos horários em quem ocorrem às aulas nas unidades de ensino do município. “Nós precisamos dos vigias cuidando das pessoas, nós não precisamos de pessoas cuidando de máquinas. Para isso, tem segurança e vigilância eletrônica”, afirmou.

A expectativa do gestor municipal é que nas próximas semanas todas as unidades escolares passem a contar com esses profissionais durante o período de aula. A Prefeitura também buscará parcerias para oferecer mais capacitação aos servidores. “Não adianta mais querermos tapar o sol com a peneira. Os problemas psicológicos estão aí, a depressão está aí e nós precisamos trabalhar sempre buscando a prevenção”.

Busque ajuda

Realizada em quase todo o mundo, a campanha Setembro Amarelo ocorre anualmente neste mês e tem o objetivo de sensibilizar e conscientizar a população sobre problemas emocionais e informar sobre os sinais que precisam ser observados com atenção, bem como os locais onde procurar ajuda.

Está passando por um período difícil? O Centro de Valorização da Vida (CVV) pode ajudar você. A organização atua no apoio psicológico e na prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo. O número é 188 e está disponível 24h, todos os dias.

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