Decreto de Roberto Naves que responsabiliza empresários pelos prejuízos com alagamentos volta ao holofote com chegada das chuvas

Ex-presidente da OAB de Anápolis, Jorge Henrique Elias, diz que documento é inconstitucional

Davi Galvão Davi Galvão -
Imagem mostra transbordamento do Córrego das Antas, na altura da Amazílio Lino. (Foto: Isabella Valverde/Portal 6)
Imagem mostra transbordamento do Córrego das Antas, na altura da Amazílio Lino. (Foto: Isabella Valverde/Portal 6)

A chegada das chuvas marca, para muitos anapolinos, o alívio após cerca de cinco meses de calor e estiagem severa. Apesar disso, para quem mora ou possui algum comércio em uma área com risco de enchente, surge a apreensão de testemunhar tudo o que foi conquistado ao longo dos anos ser levado pela água e lama, sem nenhum apoio do poder público.

Isso porque, desde agosto de 2023, um decreto de autoria do prefeito Roberto Naves (Republicanos) exime a Prefeitura de arcar com qualquer prejuízo em imóveis particulares em decorrência de alagamentos.

Conforme a letra da normativa municipal, para emitir ou renovar as licenças e certidões de uso de solo, o proprietário do imóvel comercial tem de assinar um termo de responsabilidade, concordando com a medida.

As áreas explicitadas no decreto são as seguintes: Avenidas Amazílio Lino, Ayrton Senna, Pedro Ludovico, Barão do Rio Branco, Goiás, Miguel João, Brasil Sul; Região Leste e nos Bairros Flamboyant, Residencial Buritis, Summerville, Santo Antônio, Flor de Liz, Residencial Ander 1ª e 2ª etapa, Chácaras Americanas, Jardim Itália, Morada Nova, Parque Brasília, Residencial Ipanema, Jardim Ibirapuera; Região Centro Norte, Parque da Matinha, Maracanã e Santa Izabel, Avenida Belo Horizonte e Bairro Bom Clima.

Placa de risco de alagamento em frente ao terminal rodoviário de Anápolis (Foto: Davi Galvão)

Legalidade do decreto

Para o advogado e ex-presidente da OAB Anápolis, Jorge Henrique Elias, só há uma palavra para se referir a tal medida: inconstitucional.

“O que esse decreto faz é basicamente transferir uma obrigação que era da Prefeitura diretamente para o cidadão, já que o ônus por quaisquer danos em virtude de fenômenos climáticos deveria ser do Poder Público, então é sim inconstitucional”, comentou, em entrevista ao Portal 6.

Pouco após o decreto ser publicado no Diário Oficial do Município, Jorge Henrique contou que entrou com uma ação civil pública justamente com o intuito de evidenciar a inconstitucionalidade da medida. O processo ainda não foi julgado.

O advogado, que inclusive teve o escritório destruído em 2023 por conta das chuvas, destacou que não faz sentido, por parte da Prefeitura, se eximir da responsabilidade, uma vez que os proprietários dos imóveis nas áreas de risco ainda têm de pagar impostos normalmente.

Escritório na Vila Góis ficou tomado por lama após ser inundado por chuva. (Foto: Divulgação)

“Agora, a Prefeitura autoriza passar redes de energia, autoriza a circulação de ônibus, o serviço de distribuição de água e manejo de esgoto, é porque a área é habitável. Então como não é responsabilidade do Poder Público garantir que quem mora ou trabalha lá tenha segurança nessa época de chuvas?”, questionou.

O que fazer em caso de prejuízos?

Já com relação às providências judiciais que o cidadão podem adotar caso tenha seu imóvel inundado e deseje ser reparado, diante da atual vigência do Decreto que “exime” a Prefeitura da responsabilidade,  Jorge Henrique ponderou:

“É perfeitamente possível que, mesmo após a entrada em vigor do Decreto, o cidadão possa processar o Município para ser indenizado bastando que, em sua Ação de Indenização, faça um requerimento incidental, ou seja, dentro do próprio processo, para que o Juiz decrete a inconstitucionalidade do Decreto Municipal, cabendo ao Poder Judiciário analisar, caso a caso, esse pedido”, destacou.

Desse modo, além da compensação pelo dinheiro investido em lidar com o prejuízo imediato, o cidadão também pode, dependendo do caso, pedir indenização por dano moral, com base no transtorno pelo tempo que o estabelecimento ficou parado, bem como pela renda que deixou de adquirir.

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