Diabetes, mãos amputadas e até morte: como a alimentação “humana” dos macacos da UFG se tornou fatal

Animais consomem energético, salgados e doces regularmente, desencadeando uma série de problemas que afetam até os humanos

Maria Luiza Valeriano Maria Luiza Valeriano -
Diabetes, mãos amputadas e até morte: como a alimentação “humana” dos macacos da UFG se tornou fatal
Campus tem aproximadamente 50 macacos (Foto: Reprodução/Wikimedia Commons)

Registros de animais tomando energético, comendo marmita e até com palheiro na boca no campus samambaia da Universidade Federal de Goiás (UFG) em Goiânia circulam na internet com alcance nacional. Porém, a visão cômica esconde uma triste realidade que afeta não só a saúde dos macacos, como também dos humanos.

Quem passa pelo campus já recebe a advertência: “Cuidado ao andar com comida, vai ser assaltado pelo macacos”. Alunos almoçam com mãos firmes no pratos e olhos atentos e, diariamente e sem surpresa, alguém é visto correndo de um dos animais – se não um bando inteiro.

Então, ocasionalmente, um macaco é visto em contextos ainda mais peculiares, como foi registrado por um estudante e postado no Twitter.

Cenas absurdas são tão comuns que abriram espaço para a criação da lenda de que os animais são veteranos jubilados que ali ficaram.

Naturalmente, são animais predadores que comem desde frutas, folhas, raízes, seiva, insetos, ovos de passarinhos, filhotes das aves e até adultos machucados. Contudo, os primatas, que são quase todos saguis e macacos-pregos, registram cada vez mais problemas de saúde graves devido à alimentação inadequada.

“Isso é um problema muito antigo. […] As pessoas oferecem alimentos como o próprio almoço, biscoito, refrigerante, energético, bebida alcóolica e doce porque têm curiosidade. Também, os animais pegam restos de alimentos dos lixos ou roubam dos alunos”, explicou a professora da Escola de Veterinária e Zootecnia da universidade, Luciana Batalha.

Também presentes nos parques da capital, em 2019, uma pesquisa da Agência Municipal do Meio Ambiente (AMMA) apontou que cerca de 90% sofre de altas taxas de glicemia – o que indica o desenvolvimento de diabetes. “Tudo que você vê em um ser humano com alimentação ruim pode ser notado nos macacos”, destacou a professora.

Além de diabetes, doenças da cavidade oral como cáries, obesidade e hipertensão acometem os animais. Vale destacar, ainda, que a busca pela comida também oferece um risco à vida, visto que colocam as mãos em latas, o que amputa dedos e causa necroses que podem ser fatais, além do atropelamento dos bichos.

O excesso de comida também desequilibra o ecossistema, visto que a reprodução se torna mais acelerada e, com isso, a predação de alimentos que também são consumidos por outros animais, que pagam o preço. Antes da pandemia do Covid-19, eram cerca de 70 indivíduos, o que diminuiu para aproximadamente 50 no período que o campus estava vazio.

Os humanos, por sua vez, também são afetados por esse cenário, devido à proximidade genética com os macacos. “Podemos ter uma troca de doenças com eles. Uma pessoa que tem uma tuberculose ou herpes labial que está comendo uma banana pode dar a um macaco e transmitir a doença, que é fatal para eles. Ele levará a fruta para os demais, então uma banana pode dizimar um bando inteiro”, disse Luciana.

O inverso também ocorre, sendo possível adquirir uma série de vírus e bactérias quando se tem um contato frequente com os animais, embora não sejam fatais para os humanos.

Desafio

A professora destaca que a solução não é fácil. “É turístico de Goiânia levar a família para alimentar os macacos. Tem pessoas que vão para o campus para isso”.

Ela aponta que a UFG já tentou diversas medidas para atenuar o problema, como palestras com alunos, reuniões com professores para divulgar os cuidados, panfletos, outdoors, cartazes. Contudo, o público é volátil, com a entrada e saída de milhares de alunos e visitantes todos os dias, o que dificulta atingir a todos.

“Teríamos que ter um trabalho intenso de educação ambiental, tanto no campus quanto nos parques, que têm os mesmos problemas. É uma questão muito prejudicial”, finalizou.

*Colaborou Caio Henrique.

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