Trabalhadora de Anápolis receberá indenização da Quebec após denunciar condições de trabalho degradantes
Testemunhas, inclusive uma indicada pela própria empresa, confirmaram a precariedade do ambiente de trabalho

A Justiça do Trabalho de Anápolis condenou a empresa Quebec Construções e Tecnologia Ambiental a pagar uma indenização por danos morais a uma ex-funcionária. A decisão reconhece que a trabalhadora foi submetida a um ambiente degradante e desumano durante o período em que atuou como varredora de ruas.
O caso, que tramitou na 4ª Vara do Trabalho de Anápolis, expôs uma realidade de trabalho sem banheiros ou água potável.
A advogada da reclamante, Dayanne Teles, detalhou ao Portal 6 as condições enfrentadas pela trabalhadora.
“Não havia banheiros químicos na rota de trabalho, a autora e colegas precisavam utilizar banheiros de colégios ou postos de saúde, quando disponíveis; não havia local adequado para aquecer ou realizar as refeições, sendo necessário comer na calçada ou em praças públicas; a empresa não fornecia água potável de forma contínua, sendo levada pelo fiscal apenas algumas vezes ao dia ” destacou.
Essas denúncias não ficaram apenas no depoimento da ex-funcionária. Testemunhas, inclusive uma indicada pela própria empresa, confirmaram a precariedade do ambiente de trabalho.
Direitos violados
A decisão judicial reforça um entendimento já consolidado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST). A advogada Dayanne Teles citou uma tese vinculante do TST, que estabelece:
“A falta de instalações sanitárias adequadas e de local apropriado para alimentação a empregados que exercem atividades externas de limpeza e conservação de áreas públicas autoriza a condenação do empregador ao pagamento de indenização por danos morais”, explicou.
Para a defesa, as condições impostas pela empresa “violam os direitos da personalidade e a dignidade do trabalhador, afrontando normas de higiene e segurança do trabalho”.
O juiz, ao analisar o caso, reconheceu a gravidade da situação, classificando-a como uma “violação leve aos direitos da personalidade”, considerando a curta duração do contrato (apenas 45 dias), a intensidade moderada do sofrimento e a situação econômica das partes envolvidas.
Diante do cenário, a indenização por danos morais foi fixada em R$ 3 mil, dadas as condições de trabalho e as irregularidades apresentadas pela trabalhadora.
Posicionamento
Em resposta ao Portal 6, a Quebec Equatorial emitiu uma nota manifestando repúdio à decisão, apontando que “a sentença ignorou expressamente as provas documentais, orais, e periciais, além dos precedentes, inclusive do TRT e TST, que já julgaram a mesma matéria envolvendo a empresa Quebec, e demonstraram que não houve ofensa à dignidade da trabalhadora.”
Além disso, a empresa destacou que não há exigência legal para instalação de sanitários durante o trajeto, mas sim a disponibilização de pontos de apoio, segundo a norma NR-38 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Também argumentou que havia apresentado provas de que os trabalhadores que exercem atividade externa têm acesso a instalações sanitárias durante toda a jornada laboral.
Por fim, a Quebec concluiu destacando que “a decisão é equivocada, injusta e carece de reforma”, diante do que foi apresentado diante a Justiça.
Confira a seguir a resposta completa da empresa:
“Informamos que a r. sentença ignorou expressamente as provas documentais, orais, e periciais, além dos precedentes, inclusive do TRT e TST, que já julgaram a mesma matéria envolvendo a empresa Quebec, e demonstraram que não houve ofensa à dignidade da trabalhadora.
Inicialmente, informamos que, não há exigência legal para instalação de sanitários durante o trajeto, mas sim a disponibilização de pontos de apoio, conforme determina o item 38.3.2 da NR-38 do MTE:
“38.3.2 A organização deve providenciar pontos de apoio em locais estratégicos, considerando suas rotas de trabalho, para a satisfação de necessidades fisiológicas e a tomada de refeições para os trabalhadores que realizam atividades externas, observando-se o Anexo II – Condições Sanitárias e de Conforto Aplicáveis a
Trabalhadores em Trabalho Externo de Prestação de Serviços – da Norma Regulamentadora n.º 24 (NR-24) – Condições Sanitárias e de Conforto nos Locais de Trabalho.” (g.n.)
Restou amplamente comprovado nos autos que os trabalhadores que exercem atividade externa têm acesso a instalações sanitárias durante toda a jornada laboral. Especificamente, restou provado que:
a)A empresa sempre disponibilizou banheiros químicos em atividade externa;
b)A empresa possui 102 pontos de apoio disponíveis;
c)Foi firmado convênios com estabelecimentos para uso de banheiros, acesso a água e local para alimentação;
d)Foi produzido prova pericial, confirmando que os funcionários possuíam acesso a banheiros durante a jornada de trabalho externa, inclusive em período noturno;
e)A prova oral também confirma o acesso a sanitários.
Além disso, a lei orgânica do Município de Anápolis/GO, n° 4.397/24 prevê que os estabelecimentos são pontos de apoio dos funcionários da limpeza do município, garantindo livre acesso aos trabalhadores da limpeza urbana.
Tais provas são suficientes para afastar a caracterização de condições degradantes, razão pela qual a condenação por danos morais não poderia subsistir, ou ao menos deveria ser fundamentada com análise crítica de tais elementos — o que não foi feito.
Essa questão já restou decidida pela Corte Superior, onde figura na ação a empresa reclamada, com pleito semelhante, sob mesma alegação, e restou afastado o pedido de danos morais. A esse respeito, destaca-se o seguinte trecho do V. Acórdão:
“AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR – LIMPEZA URBANA – PROVA DA EXISTÊNCIA DAS INSTALAÇÕES SANITÁRIAS – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL INDEVIDA. Restou incontroverso no acórdão o labor externo e itinerante do Reclamante como auxiliar de limpeza em via pública. A decisão agravada não conheceu do recurso de revista do obreiro, sob o fundamento de que, inobstante se aplique ao caso a que a NR-24, que fixa normas visando à garantia a condições sanitárias e de alimentação minimamente razoáveis, consta do acórdão regional informação de que a reclamada disponibilizava banheiros químicos aos empregados, o que afasta o direito à indenização pelo suposto dano moral. Pois bem. De fato, a jurisprudência predominante neste Colendo Tribunal Superior do Trabalho, a qual me filio , vem se posicionando em sentido de que a obrigação do empregador de fornecer um ambiente de trabalho salubre, com instalações sanitárias adequadas, estende-se também aos trabalhadores que exercem suas atividades em ambientes externos e itinerantes, conforme preceitua a NR-24 do MTE. No entanto, ao contrário do que alega o reclamante, o acórdão regional expressamente consigna que havia banheiros químicos no local de trabalho do obreiro, conforme trecho a seguir: “Foi determinada verificação pericial no processo e o perito judicial, f. 1431 e s. dos autos, verifica que os empregados têm acesso a água, banheiro químico e refeição, sendo que à noite o acesso é naturalmente menor, mas possível”. Assim, como o Tribunal Regional do Trabalho é soberano na definição do quadro fático, não há como revolver o acervo probatório carreado ao processo, ante o óbice da Súmula 126 do TST. Agravo interno desprovido” (RR-0010199-96.2023.5.18.0051, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 11/03/2025). (g.n.)
Em recentíssimo Acórdão proferido pelo C. TST em 16/05/2025, nos autos 0011607-88.2024.5.18.0051, NOVAMENTE foi rejeitado o pedido de danos morais, por comprovado as condições de saúde e higiene. Vejamos o trecho do Acórdão:
“INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – AUSÊNCIA DE INSTALAÇÕES SANITÁRIAS
A reclamante interpõe recurso ordinário buscando a reforma da sentença que julgou improcedente seu pedido de indenização por danos morais.
Alega que comprovou, por meio de prova testemunhal, as condições degradantes de trabalho, especialmente a ausência de banheiros adequados antes de junho de 2024 e a insuficiência dos banheiros químicos implementados posteriormente.
Sustenta que a reclamada expôs seus empregados a situações humilhantes e invoca precedente vinculante do TST que ampara seu pedido indenizatório em casos de falta de instalações sanitárias adequadas em atividades externas.
Requer a reforma da sentença para condenar a reclamada ao pagamento de indenização por danos morais.
Ao exame.
A decisão de primeiro grau, ao indeferir o pedido de dano moral, alinha-se com o entendimento consolidado desta Eg. 2ª Turma, especialmente consubstanciado na Súmula nº 66 do TRT18, a qual estabelece que a ausência de instalações sanitárias para trabalhadores da limpeza urbana que atuam externamente, por si só, não configura ilícito ensejador de dano moral indenizável.
É bem verdade, como bem lembrado pelo Excelentíssimo Desembargador Daniel Viana Júnior em seu voto, onde divergência da fundamentação e que eu acolho, que o c. TST aprovou, em IRR, a Tese 54 no sentido de que “A ausência de instalações sanitárias adequadas e de local apropriado para alimentação a empregados que exercem atividades externas de limpeza e conservação de áreas públicas autoriza a condenação do empregador ao pagamento de indenização por danos morais, pois desrespeitados os padrões mínimos de higiene e segurança do trabalho, necessários e exigíveis ao ambiente de trabalho (NR-24 do MTE, CLT, art. 157, Lei nº 8.213/91, art. 19, e CRFB, art. 7º, XXII).”
Todavia, no caso em tela, a sentença fundamenta sua decisão na prova documental apresentada pela reclamada (termo de cooperação para uso de instalações sanitárias, fls. 515/520; e fotografias, fls. 521/545 e 578/583) e na prova pericial (fls. 492/501) emprestada de outro processo envolvendo a mesma empresa e alegações semelhantes.
As referidas provas indicam que os empregados tinham acesso a local de refeição, água e banheiro (ainda que com possível redução de acesso noturno).
(…)
Portanto, diante da prova produzida pela reclamada, da fragilidade da prova testemunhal da autora e da aplicação da Súmula nº 66 do TRT18, entendo existir distinguinshing que justifica a não aplicação da Tese
Vinculante citada, de modo que a conclusão da sentença de primeiro grau de que não restou comprovado o dano moral indenizável mostra-se acertada e em consonância com o entendimento desta Turma.
Ante ao exposto, mantenho a sentença que indeferiu o pedido de indenização por danos morais, com base na prova dos autos e na Súmula nº 66 do TRT18.
Nego provimento.” (g.n.)
Portanto, conforme precedentes do próprio TST, a decisão é equivocada, injusta e carece de reforma.”
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