Sem médicos, enfermeiros atuam na ‘linha de frente’ em alguns postos de saúde de Anápolis

Conselheira da Comissão de Direito da Saúde da OAB orienta que população provoque o Ministério Público

Maria Luiza Valeriano Maria Luiza Valeriano -

Na última semana, uma mãe precisou levar o filho pequeno com sintomas gripais na Unidade Básica de Saúde (UBS) do Parque Iracema, em Anápolis. Por falta de médico, foi atendida por uma enfermeira, que prescreveu uma série de medicamentos e encaminhou a dupla de volta para casa. Quando a criança não apresentou melhoras dentro de 24h, a mulher retornou, sendo atendida por um médico na segunda visita.

Sem equipe multidisciplinar completa em algumas das 47 Unidades Básicas de Saúde (UBS) espalhadas pelo município, esse está longe de ser um caso isolado. O Portal 6 teve acesso ao receituário e, embora as prescrições médicas e de exames clínicos aviados por enfermeiros sejam previstas em lei, gera desconforto entre os envolvidos e não é considerada a ideal.

De acordo com uma enfermeira que atua na rede pública de saúde há 21 anos, cuja identidade foi preservada, o cenário é de ausência de médicos há pelo menos três meses e, com isso, as equipes de enfermagem se posicionaram na linha de frente.

A profissional destacou que unidades como a Recanto do Sol e Jardim América, por exemplo, são locais onde pacientes relatam constante ausência de uma equipe de saúde completa. “Nisso, os enfermeiros trabalham com referência para outras unidades de saúde ou então fazem o atendimento em alguns casos.”

Porém, com todas as demandas já existentes,  ela explica que a classe manifesta desconforto perante a tarefa e, na maior parte dos casos, são tratadas com desdém por pacientes que recusam atendimento.

A Secretaria Municipal de Saúde (Semusa), reforça que o enfermeiro possui autonomia técnica e científica para realizar consulta de enfermagem e prescrição em casos de gestação de baixo risco, crescimento e desenvolvimento da criança, entre outros.

“Esta atuação está prevista nos protocolos oficiais do Ministério da Saúde e legislação do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), que regulamenta a atuação desta categoria. É importante ressaltar que a consulta de enfermagem deve ser concomitante com a consulta médica”, declarou em nota. No entanto, não é o que tem acontecido e, embora legal, o cenário bate de frente com outra recomendação.

A prova é o próprio posicionamento do Conselho Regional de Medicina do Estado de Goiás (Cremego), que reforçou por nota que “nenhuma unidade de assistência médica pode funcionar sem o trabalho de profissionais médicos e que atos médicos só podem ser executados por médicos”.

Vale destacar que, no caso analisado, a equipe de enfermagem atuou somente na atenção primária, prevista pela Lei do Exercício Profissional de Enfermagem. Em relação aos limites da atuação dos enfermeiros perante a ausência de médicos, a entidade não respondeu.

Além disso, o CREMEGO destacou a falta de ciência da atuação de equipes incompletas no dia a dia das UBS de Anápolis. No entanto, o cenário se mostra contraditório, já que a ausência foi notada pela própria Semusa.

Questionada pelo Portal 6 sobre o déficit de profissionais, a secretaria afirmou que realiza credenciamentos de médicos e 12 serão chamados para atender as unidades.

Para a conselheira seccional e membro da Comissão de Direito da Saúde da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Caroline Regina dos Santos, em um cenário em que casos de gripe evoluem para Covid-19 ou Síndrome Respiratória Aguda Grave e até óbitos, a presença de médicos em postinhos é indispensável.

Diante disso, Caroline reforça o papel do Conselho Regional de Enfermagem de Goiás (Coren-GO) em preparar os profissionais para que executem as funções necessárias da melhor forma, sem prejudicar a saúde dos cidadãos.

Além disso, a advogada aponta que a população deve provocar o Ministério Público sempre que presenciar uma falta de médico, uma vez que, embora o CREMEGO seja o órgão fiscalizador, é necessário a ação conjunta para identificar falhas na saúde.

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